Universo Inflacionário


guth
Alan Harvey Guth

A matéria escura têm implicações importantes nos modelos de Big Bang, como o do Universo Inflacionário. Este modelo de Universo, proposto em 1979 por Alan Harvey Guth, do Massachussets Institute of Technology (MIT), nos Estados Unidos [Physical Review D 23, 347 (1981)], e Alexei Starobinski [Pisma Zhurnal Eksperimentalnoi i Teoreticheskoi Fiziki 30, 719 (1979)], na Rússia, e modificado em 1981 pelo russoAndrei Dmitrvitch Linde, e pelo americano Paul J. Steinhardt , [Alan Guth, Inflationary Universe: A Possible Solution to the Horizon and Flatness Problems, Phys. Rev. D 23, 347 (1981); A. Linde, A New Inflationary Universe Scenario: A Possible Solution of the Horizon, Flatness, Homogeneity, Isotropy, and Primordial Monopole Problems, Phys. Lett. B 108, 389 (1982); A. Albrecht and P. J. Steinhardt, Cosmology for Grand Unified Theories with Radiatively Induced 4 Symmetry Breaking, Phys. Rev. Lett. 48, 1220 (1982)] vem de uma das formas das Teorias da Grande Unificação (GUT) das forças forte e eletrofraca que prevê uma quebra de simetria espontânea tex2html_wrap_inline38 s depois do Big Bang. Esta quebra de simetria, ou transição de fase, faz agravitação agir repulsivamente, expandindo o Universo um fator de tex2html_wrap_inline40. Depois de tex2html_wrap_inline42 s, a teoria é

Peter Ware Higgs
Peter Ware Higgs

idêntica ao Big Bang padrão. Outra interpretação da mesma transição de fase é que a liberação do calor latente (energia do vácuo) é que faz o Universo se expandir inflacionariamente. Quando publicada em 1979, a transição de fase (super-esfriamento) era prevista ter ocorrido em 10-35s, mas o valor moderno da energia de Higgs [Peter Ware Higgs (1929-)] é de 1016 GeV, correspondente a 10-37 s pelo princípio da incerteza: incerteza. O bóson de Higgs é

a partícula que dá massa a todas as outras partículas, no Modelo Padrão das forças nucleares. O Grande Colisor de Hádrons, LHC, com feixes de 7 TeV cada, está testando a existência do bóson de Higgs, e encontrou fortes evidências da existência de uma partícula deste tipo.

Enquanto no modelo inicial de Guth nosso Universo seria composto de muitas bolhas que se expandem exponencialmente, o que é inconsistente com a uniformidade da radiação do fundo do Universo, nos novos modelos inflacionários de Linde e Steinhardt nosso Universo é apenas uma bolha de um possível mega-Universo (megaverso) de bolhas.

bolhas inflac

A teoria inflacionária prevê que a matéria escura não pode ser totalmente bariônica, mas é consistente com matéria escura fria, isto é, partículas com velocidade muito menor do que a velocidade da luz (neutrinos devem ter velocidade próxima a da luz). O modelo inflacionário prevê ainda que o Universo contém cem vezes mais matéria ou energia escura do que a matéria que brilha nas estrelas e, portanto, que o Universo é tridimensionalmente plano. Este modelo explicaria a estrutura de grandes paredes e buracos observadas na estrutura de grande escala do Universo, e que não estão casualmente conectadas atualmente, mais o seriam antes da expansão inflacionária. Diz-se que duas regiões não estão casualmente conectadas se, quando a radiação foi emitida por elas, as regiões no espaço estavam mais distantes do que a distância que a luz poderia ter atravessado desde o Big Bang. A mesma Teoria de Grande Unificação que prediz o Universo inflacionário, também prediz que os prótons deveriam decair em tex2html_wrap_inline44 anos, o que não é observado (tex2html_wrap_inline46 anos), de modo que as teorias mais simples da GUT já foram eliminadas. Teorias de grande unificação que permitem a quebra de simetria que formou a assimetria de matéria-antimatéria antes de tex2html_wrap_inline48 segundos, ainda são consistentes com o tempo de decaimento do próton observado. Nas Teorias de Grande Unificação, as diferenças observadas entre quarks e léptons e entre as três forças – eletromagnética, fraca e forte – são fenômenos de baixa energia que emergem através da quebra espontânea da simetria de unificação, em energias acima de 1 TeV. Jogesh C. Pati previu, em 2000, no Physics of Atomic Nuclei, Volume 63, 1058, que o decaimento do próton pode ocorrer só acima de 1034 anos, com decaimento dominante pelo canal antineutrino-kaon+. A teoria inflacionária explica como as flutuações quânticas primordiais podem se expandir para tornar-se as sementes que produzem a estrutura do Universo, por colapso gravitacional. Mas o que acontece para tempos aindas menores, dentro da escala de Planck (10-43s), quando a força gravitacional tem valores comparados com as outras forças e os efeitos da gravidade quântica eram importantes, e as condições estão fora de nosso conhecimento do espaço e do tempo? Que condições existiam antes da inflação e como elas afetam os modelos inflacionários? Como resolver o problema da singularidade, quando a densidade de energia, a curvatura do espaço-tempo e a temperatura são infinitas?

A Teoria de Tudo precisa combinar a teoria de relatividade geral (gravitação) com a teoria quântica. A mais promissora teoria no momento é a de supercordas (superstrings, cordas supersimétricas). Nesta teoria, as “partículas” fundamentais são cordas que vibram. As ressonâncias nestas cordas criam as partículas diferentes. Cada corda é extremamente pequena, cerca de 1020, ou 100 bilhões de bilhões de vezes, menor do que um próton,

lplanck

e vibra em um espaço com 10 ou 11 dimensões. Como o espaço-tempo tem 4 dimensões, as outras 6 ou 7 dimensões seriam colapsadas e, portanto, não observáveis. Na teoria, o Universo com 10 dimensões é instável e a energia liberada no colapso das 6 dimensões é que provoca o Big Bang. Uma modificação das supercodas é a teoria de (mem)branas (Philippe Brax, Carsten van de Bruck, Anne–Christine Davis, 2004, Reports on Progress in Physics, 67, 2183). Outra teoria é a da quantização do espaço-tempo, que propõe que o Big-Bang foi precedido de um colapso (rebote). Estas teorias ainda precisam ser testadas.

A matéria escura não emite radiação eletromagnética e, portanto, somente podemos detectá-la através da força gravitacional que ela exerce sobre os objetos. A detecção da existência de matéria escura vem do estudo do movimento de estrelas individuais em galáxias e o movimento de galáxias em cúmulos de galáxias, mas também pelo seu efeito em lentes gravitacionais. Quando aplicamos a lei da gravitação a estes movimentos, detectamos que a massa é muito maior que a massa visível em estrelas e gás.

bullet
A distribuição de matéria no cúmulo de galáxias 1E 0657-56, que está a 3,4 milhões de anos-luz de distância, numa imagem composta com medidas no raio-X (em vermelho: NASA/CXC/CfA/ Maxim Markevitch et al. 2005), e no ótico (NASA/STScI; ESO WFI; Magellan/U.Arizona/ Douglas Clowe et al. 2006). A massa de gás quente detectado no raio-X é muito maior do que a massa no ótico, mas muito menor do que a da matéria escura. Em azul está indicada a distribuição da matéria escura, necessária para explicar as lentes gravitacionais observadas.

O que é esta matéria escura? Se sua quantidade fosse 5 a 10 vezes maior do que a de matéria luminosa, ela poderia se constituir de partículas normais (bárions), prótons e nêutrons, não condensados em estrelas, poeira ou gás, ou deveríamos detectá-los. Poderia entretanto ser composta de buracos negros (objetos colapsados gravitacionalmente), anãs marrons (objetos degenerados mas de massa inferior a estrelas e maiores que Jupiter) e planetas (que não geram sua própria luz). Mas as procuras por microlentes gravitacionais demonstram que menos de 2% da matéria de nossa Galáxia está em objetos compactos, isto é, a matéria escura também não está na forma de buracos negros ou estrelas compactas. Se entretanto a matéria/energia escura fosse 100 vezes a luminosa, como a teoria inflacionária sem energia escura exige, então estaria em partículas exóticas ainda não detectadas na Terra, como neutrinos massivos, ou monopolos magnéticos, ou áxions, além da energia escura. Estas partículas ou energia podem compor mais de 90% da massa do Universo, sem participar da formação de estrelas, planetas e seres humanos.

No Sudbury Neutrino Observatory, em Ontário, Canadá, com 1000 toneladas de água pesada e 9456 fotomultiplicadoras, a 2070 metros de profundidade, operando desde novembro de 1999, foi medido um fluxo de neutrinos do Sol provenientes da reação do ciclo próton-próton envolvendo o Berílio8 de 5,44±0,99 ×106 cm-2s-1, com evidência de oscilação de neutrinos que indica que a soma das massas dos 3 tipos de neutrinos está entre 0,05 a 8,4 eV. Estas massas levam à contribuição dos neutrinos na densidade do Universo entre 0,001 e 0,18 da densidade crítica. Ou seja, os neutrinos não são a forma dominante de matéria escura.

COBE

cobesEm 18 de novembro de 1989, a NASA lançou um satélite chamado Cosmic Background Explorer (COBE), para analisar detalhadamente a radiação do fundo do universo (Cosmic Microwave Background – CMB) operando na faixa de microondas. Como planetas, estrelas, galáxias e nuvens de gás emitem muito pouco microondas, o satélite podia enxergar diretamente a luz que o Universo emitiu quando passou de opaco para transparente, na chamada época da recombinação, cerca de 380 mil anos depois do Big Bang.

atom
mather
John Cromwell Mather

Os dados obtidos pelo COBE, mostrados na figura abaixo, e divulgados por John Cromwell Mather – cientista coordenador do projeto COBE, fitam perfeitamente um corpo negro com temperatura de 2,735 K, com uma incerteza menor que 1%, valor da radiação predita para o gas quente de quando o Universo se formou, visto com um avermelhamento correspondente; a expansão do Universo estica o comprimento de onda pelo mesmo fator que o Universo se expande entre a emissão e a observação. Se o Big Bang tivesse sido caótico, por exemplo, o espectro observado não seria perfeitamente o de um corpo negro, mas seria distorcido para o azul, pelo decaimento das estruturas caóticas.

Cada metro cúbico do Universo contém, em média, 400 milhões de fótons e somente 0,1 átomos.

firas
Resultados do experimento FIRAS do satélite COBE, mostrando que a radiação do fundo do Universo segue mesmo a lei da radiação de Planck.
George Fitzgerald Smoot III
George Fitzgerald Smoot III

A radiação do fundo do Universo mostra suas condições 380 mil anos após o Big Bang, quando o Universo era dominado por radiação. Nesta época a temperatura do Universo caiu para cerca de 3000 K, suficiente para que os prótons e as partículas-α (He), formadas nos três a quatro primeiros minutos do Universo, começassem a capturar elétrons e formar átomos de hidrogênio e hélio neutros. Os cosmólogos chamam esta fase de recombinação, ou fase de desacoplamento, passando de um Universo dominado por radiação, onde a temperatura da matéria era a mesma temperatura da radiação, para um dominado por matéria.

Em outro experimento do satélite COBE, divulgado em abril de 1992 por George Fitzgerald Smoot III, da Universidade da Califórnia em Berkeley, também foram detectadas pequeníssimas variações da temperatura nesta radiação (seis partes por milhão). A resolução angular do COBE era de 7°. A uniformidade das medidas só é compatível com a existência do Big Bang, pois de outra forma regiões distintas do Universo não poderiam estar com a mesma temperatura. John Cromwell Mather e George Fitzgerald Smoot III ganharam o prêmio Nobel de física de 2006 pelas descobertas com o COBE.

cobe

Os fóns carregam informação sobre a distribuição de matéria na época do desacoplamento da radiação com a matéria, pois se o fóton estava em uma região um pouco mais densa, parte de sua energia foi gasta para escapar do campo gravitacional. Nos modelos de formação de galáxias, estas flutuações são necessárias para permitir que a matéria formada posteriormente se aglomerasse gravitacionalmente para formar estrelas e galáxias, distribuídas em grupos, bolhas, paredes e vazios, como observamos.

2dFGRS
Distribuição de galáxias medidas pelo 2dF Galaxy Redshiffht Survey, cobrindo 6 bilhões de anos-luz.
gravity
Amplificação gravitacional de pequenas perturbações na distribuição de massa inicial.

No modelo padrão, as estruturas do Universo são formadas a partir da amplificação gravitacional de pequenas perturbações na distribuição de massa inicial. Seria praticamente impossível haver a formação de estruturas observadas, como galáxias, estrelas, planetas e, portanto, da Terra e de nós mesmos, sem que houvessem variações de temperatura na radiação do fundo do Universo. Isto porque a radiação e a matéria estiveram em equilíbrio térmico no Universo primordial e, então, qualquer irregularidade ocorrida na distribuição inicial de matéria seria refletida na distribuição angular desta radiação. A detecção destas flutuações até então era o principal ponto faltante na compreensão da teoria do Big Bang e da formação e evolução do Universo. As flutuações de densidade observadas pelo COBE poderiam ser oriundas de cordas cósmicas geradas nas transições de fase, ou poderiam ser simples flutuações normais de uma distribuição aleatória de densidade. Com o esfriamento do Universo, eventualmente a matéria se condensa em galáxias, estrelas se formam [as primeiras estrelas se formam, nos modelos de matéria fria escura, quando o deslocamento para o vermelho (redshift) z = 10 a 20 e a temperatura da radiação de fundo da ordem de 50K], evoluem e morrem, e elementos mais pesados, como carbono, oxigênio, silício e ferro foram gradualmente sendo sintetizados nas estrelas, e espalhados ao meio em explosões de supernovas. Este gás é depois concentrado em outras estrelas, em planetas, e possivelmente em corpos de seres humanos, em alguns destes planetas!

oval
A Via Láctea em coordenadas galáticas.
Planck_CO_AllSky
Imagem do gás molecular obtida em CO pelo Satélite Planck, da ESA.

FONTE: Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS

Créditos: Kepler de Souza Oliveira Filho

© Os textos, gráficos e imagens desta página têm registro: ISBN 85-7025-540-3 (2000), ISBN 85-904457-1-2 (2004), ISBN 978-85-7861-187-3 (2013), e só podem ser copiados integralmente, incluindo o nome dos autores em cada página. Nenhum uso comercial deste material é permitido, sujeito às penalidades previstas em lei.
© Kepler de Souza Oliveira Filho & Maria de Fátima Oliveira Saraiva

2 comentários em “Universo Inflacionário

Deixe um comentário

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.